quinta-feira, 29 de abril de 2010

FUNÇÃO EXTRAORDINÁRIA DOS APÓSTOLOS - I-II-1

No apostolado há uma função ordinária e uma função extraordinária. Esta extinguiu-se com a morte dos doze, aquela há de perpetuar-se na Igreja até o fim dos tempos. Aqui a filosofia das palavras traz-nos a contribuição de sua luz. Ordinário, numa sociedade é o que pertence à sua constituição estável, à ordem sem a qual não pode subsistir. Extraordinário é o que está fora desta ordem, é o que depende de particulares circunstâncias, estranhas à organização regular da vida social. O ordinário é, por sua natureza, duradouro, definitivo, normal; o extraordinário é passageiro, provisório, acidental.

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Livro I - A Igreja Católica
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Capítulo II - S. PEDRO, PAPA IMORTAL

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§1. - Perpetuidade do primado de S. Pedro.
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SUMÁRIO - Demonstração da tese católica; O Evangelh0; a razão; a história e o primado do Pontífice romano.

S. Pedro não foi por Cristo constituído chefe visível da sua Igreja: primeira negação protestante. S. Pedro não esteve em Roma e menos ainda estabeleceu na cidade eterna a sede do seu principado: segunda negação protestante. S. Pedro ainda que houvesse recebido do Salvador a primazia do poder, não a poderia ter transmitido aos bispos de Roma; privilégios pessoais não se transferem por herança: terceira negação protestante.

Tais os golpes demolidores de camartelo com que o Sr. CARLOS PEREIRA se felicita de haver desmudado os alicerces do papado, "edifício de estrutura gigantesca, repousado, entretanto, sobre a areia movediça da ignorância supersticiosa e da indiferença interesseira dos homens", p. 248.

Originalidade no argumentar? Não; é um retrilhar, com ligeiras variantes, os cansados paralogismos do velho LUTERO nas suas primeiras arremetidas contra o papa.1 Milhares de vezes a crítica pulverizou a inanidade destes sofismas. Mas os protestantes não se dão por entendidos e continuam a repeti-los com o mesmo convencimento
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1. Cfr.Resolutio lutherana super propositione XIII de potestate papae, Weimar, II, 191-7.
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de vitória, com a mesma satisfação de triunfo incontestado. É uma velha panóplia enferrujada de museu arqueológico e eles a envergam inocentemente como armadura açacalada para modernos combates.

Seguindo fielmente os passos do apologista brasileiro da Reforma, somos chegados à sua terceira negação. A primazia de Pedro é uma herança instransmissível que não tem nem pode ter sucessores. E por que? Os "apóstolos eram funcionários extraordinários (que termo prosaico! Que cheiro de repartição pública!) especiais que não tiveram nem podiam ter sucessores", p. 255; eram testemunhas oculares da ressurreição de Cristo, dotados de infalibilidade pessoal, do dom de fazer milagres, etc. Como, pois, podiam ter sucessores? "Para herdarem os Papas o primado, necessário é que herdem o apostolado e sejam sucessores do apóstolo antes de o serem do primaz", p. 246.

Ao ilustre gramático não ocorreu uma distinção óbvia que deslinda todo o equívoco sobre o qual levanta a sua argumentação. No apostolado há uma função ordinária e uma função extraordinária. Esta extinguiu-se com a morte dos doze, aquela há de perpetuar-se na Igreja até o fim dos tempos. Aqui a filosofia das palavras traz-nos a contribuição de sua luz. Ordinário, numa sociedade é o que pertence à sua constituição estável, à ordem sem a qual não pode subsistir. Extraordinário é o que está fora desta ordem, é o que depende de particulares cicunstâncias, estranhas à organização regular da vida social. O ordinário é, por sua natureza, duradouro, definitivo, normal; o extraordinário é passageiro, provisório, acidental.2

Ao ponto agora.

Quando Cristo enviou os seus apóstolos à conquista do mundo, dotou-os sem dúvida de qualidades extraordinárias exigidas pelas condições excepcionais da sua missão. Primeiros promulgadores da lei evangélica numa sociedade pagã, quis o Salvador vigorar-lhes a potência da palavra com a força das obras prodigiosas. Destinados a transmitir aos séculos vindouros o patrimônio íntegro das verdades reveladas, convinha assegurar-lhe a autoridade com o dom da infalibilidade pessoal. Mas ao lado destas
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2. Assim, numa sociedade o exercício do governo dentro das normas constitucionais é regular e estável. Circunstâncias excepcionais, porém, podem levar a nação a investir o soberano de poderes extraordinários. Ao chefe constitutional sucede então o ditador. Passado o perigo, cessam, ipso facto, as suas atribuições anormais. Aos sucessores se transmitirá a função ordinária de governar, não os privilégios extraconstitucionais de que, num momento de singular gravidade, o investira excepcionalmente a vontade da nação.__

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funções extraordinárias, requeridas pela fundação e estabelecimento da Igreja, deviam também os apóstolos desempenhar uma função ordinária nesta sociedade indefectível. Não só nos primeiros tempos de sua existência, mas pelos séculos afora, precisariam os fiéis de mestres que os doutrinassem e de superiores que os governassem. Sem estas funções não há nem pode haver sociedade religiosa. No apóstolo, o taumaturgo, o hagiógrafo passarão, o mestre e o pastor há de perpetuar numa sucessão ininterrupta. É a análise imediata dos textos que distingue naturalmente esta dupla função.

Abramos o Evangelho e ouçamos as palavras divinas desta investidura perpétua: "Ide, pregai a todos os povos... ensinando-os a observar tudo o que vos mandei; e eu estarei convosco todos os dias, até a consumação dos séculos" (Math., XXVIII, 19-20). Que explendor de evidência! Os enviados de Cristo deverão ensinar e pregar a todos os povos; Cristo os acompanhará com a sua assistência até a consumação dos séculos. Logo os apóstolos, não como pessoas físicas, mas como corpo moral que se perpetua nos seus sucessores, hão de durar até o fim dos tempos.

Escusado era, pois, ao Sr. CARLOS PEREIRA tanto dispêndio de tinta e papel para provar-nos que os papas não são testemunhas oculares da ressurreição de Cristo nem possuem o dom dos milagres e que, nisso, não podem ser sucessores de S. Pedro. Não se arrombam portas abertas. O que cumpria mostrar é que os bispos de Roma não são legítimos sucessores do príncipe dos apóstolos no múnus ordinário de ensinar e governar a Igreja.

Negará, porventura o adversário que o primado de jurisdição seja um múnus ordinário na sociedade cristã? Dirá, talvez que é privilégio pessoal conferido excepcionalmente a Pedro? É consultar o Evangelho, é ouvir a razão, é compulsar a história.

O Evangelho diz-nos que Pedro é o fundamento sobre o qual Jesus constuiu a sua Igreja, sociedade visível, que há de durar até o fim dos tempos e contra a qual não hão de revalecer as portas do inferno. A fórmula evangélica é aqui de um relevo empolgante. De um lado afirma a perenidade da Igreja, do outros constitui a Pedro sua pedra fundamental. Ora, a perpetuidade de um edifício é essencialmente condicionada pela estabilidade de seus alicerces. Repudiando esta pedra fundamental que é a sua autoridade de governo, a Igreja apartar-se-ia das intenções de Cristo, destruiria a própria organização constitucional que lhe impôs a vontade de
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seu divino fundador.3 No dia em que viesse a faltar o principado hierárquico de Simão, a pedra escolhida pelo Salvador, as portass do inferno teriam prevalecido: sem base, o edifício aluiria em inevitável ruína.

Esse dia não despontará nunca. Há vinte séculos que todos os poderes da terra coligados arremetem contra essa rocha firmada pela mão de Deus. Há vinte séculos que a dinastia dos sucessores de Pedro continua na história como um milagre vivo, sem exemplo na ordem moral. Digitus Dei est hic.

Esteja certo, Sr. CARLOS PEREIRA, o relógio do tempo não soará nunca a hora em que "o ídolo do Vaticano será precipitado no seio da história com o ímpeto de uma pedra, arremessada no fundo do mar", p. 250. A audácia da metáfora não logra disfarçar o quixotesco da profecia.

Diz-nos ainda o Evangelho que Pedro é sem restrições de tempo nem de lugar o pastor do rebanho de Cristo. O rebanho existe? Não há de faltar quem o pastoreie. Nunca será que as ovelhas do redil de Cristo tresmalhem, desgarradas pelo mundo, sem pastor que as apascente, guie e defenda.

Assim fala o Evangelho a quem quer que, sem as lentes esfumaçadas de LUTERO, o lê com olhos puros e desapaixonados.

E a razão? Confirma admiravelmente a palavra sagrada. Em todas as obras de Deus resplandece uma unidade maravilhosa, sigilo inconfundível da Sabedoria criadora.

Já na ordem física, tudo é harmonia, consonância, regularidade. Tomai uma planta em que aparece a vida na mais rudimentar de suas formas. De um pequenino germe se desenvolvem, a pouco e pouco, raiz, tronco, ramos, folhas, flores e frutos. A esmo, à ventura? Não, na célula primitiva, lá estava, oculto e invisível, mas real e ativo o princípio de unidade que havia de dirigir a grandiosa e complicada evolução. A terra, o ar, a água subministram o variado material, mas na planta está o arquiteto, que com ele levanta, segundo um plano definido, o edifício vivo. Multiplicam-se as células, mas a sua atividade é subordinada à do órgão; diferenciam-se
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3. "Ce n'est pas sans cause que la tradition catholique a fondé sur ce texte le dogme de la primauté romaine. La conscience de cette primauté inspire tout le developpement de Matthieu, qui n'a pas eu seulement eu yue la personne histoirque de Simon, mais aussi la succession tratitionelle de Simon Pierre". A LOISY, Les Evangiles Synoptiques, 1908, t.II,p. 13.___

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os órgãos, mas a sua função é subordinada à do aparelho; reunem-se os aparelhos, mas ao acrescimento, conservação e defesa do organismo inteiro subordina-se todo o seu funcionamento. O desenvolvimento do indivíduo, a perpetuação da espécie, eis o grande objetivo unificador que estabelece a harmonia na variedade dos elementos subordinados.

Vede o homem. No corpo, são os centros nervosos que dirigem, unificam e harmonizam toda a vida orgânica. Do cérebro partem os infinitos filetes nervosos que levam movimento e vida e trazem impressões e conhecimentos. Na alma, que variedade de potências! Estas, materiais e orgânicas; aquelas, independentes do organismo e espirituais. A todas preside a vontade que empunha o centro do governo. A vontade recebe a luz da inteligência, a inteligência amolda-se à verdade objetiva que, em última análise, se vai identificar com Deus. Sempre a mesma lei: a ordem na unidade, a unidade na subodinação.

Passai do indivíduo à coletividade, ascendei do mundo físico ao mundo moral. É possível conceber um agrupamento humano por mais simples e elementar, sem princípio unificador, sem autoridade? A família é a primeira das sociedades naturais, a célula primigênia do grande organismo moral que se chama pátria. Contam-se os seus limitados membros, mas não lhes falta a autoridade paterna a vinculá-los na harmonia da ordem, na subordinação do amor. Crescem os indivíduos que põem a sua atividade a serviço dum fim comum? Pesa mais forte a necessidade de um poder superior. Podeis imaginar exército sem general, esquadra sem almirante? Na sociedade civil a autoridade é a condição da ordem, da legalidade, da justiça, da própria existência. Não lhe discuto o nome. Chame-se rei ou imperador, doge ou sultão, cônsul ou presidente; concretize-se numa individualidade física ou numa pessoa moral, pouco importa: a exigência é sempre a mesma, a necessidade é sempre inevitável. Sem governo tende a desordem, a revolução, a anarquia, a morte.

Ora, Jesus Cristo fundou a sua Igreja como uma grande sociedade. Poderíamos por um só instante persuadir-nos que não tivesse dado um chefe em torno do qual se reunissem os crentes: Fora lícito aventurar que a Providência se mostrara menos solícita com a sociedade cristã do que o foi com a sinagoga, para cuja conservação instituíra e mantivera a autoridade espiritual do supremo

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sacerdócio? Uma pequenina sociedade não pode subsistir sem governo legítimo e regular e esta grande família destinada a acolher em seu seio os homens pelos séculos afora, a vinculá-los na unidade da fé, da esperança e do amor, teria sido abandonada às vicissitudes das paixões que dividem, sem um centro de unidade, sem um princípio de coesão, sem um chefe supremo que a instruísse, guiasse e regesse, sem uma autoridade que lhe compusesse os dissídios, resolvesse as dúvidas e conservasse a existência orgânica? Não fora esta uma desarmonia no plano divino? Onde há uma sociedade de homens a razão exige um governo.

E o governo é permanente como a necessidade social que exige. Admitir em Pedro um poder de jurisdição como privilégio pessoal e intransmissível é contra-senso jurídico. A autoridade é função pública cuja única razão de ser é o bem social. Pedro preferido por sua fé aos demais apóstolos para primeiro chefe da Igreja, entende-se; o cargo de supremo pastor da sociedade cristã criado para prêmio individual de um homem fora sem razão inadmissível. É, pois, a natureza orgânica da instituição divina que exige a perpetuidade do primado. Cristo, estabelecendo uma sociedade visível qui-la una como uma só coisa são as divinas pessoas, ut sint sicut et nos unum sumus. Ora, pondera S. TOMÁS, “não há unidade da Igreja sem unidade de fé... não há unidade de fé sem um chefe supremo”.4

Deve ser bem evidente a necessidade perene da monarquia espiritual do Pontífice para que a confessem os mais ilustres protestantes que não fecham obstinadamente os olhos à luz da verdade. LEIBNIZ e GRÓCIO são talvez os mais profundos talentos de que na filosofia e na jurisprudência se podem gloriar as letras protestantes; ambos concordam em reconhecer essa necessidade fundamental. Memoremos apenas as palavras do célebre jurista holandês: “A ordem, assim nas partes como no todo, cifra-se no primado ou unidade do chefe. Foi o que em Pedro nos ensinou Cristo. Foi o que de Cristo aprendeu Cipriano, o que com Cipriano repete Jerônimo...
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4. Contra Gentes, 1. IV, c. 76 DE MAISTRE desenvolve admiravelmente este pensamento: "S'il s'élevait des difficultés dans l'Eglise, si quelque dogme était attaqué, où serait le tribunal qui deciderait la question, n'y ayant plus de chef commum pour ces Eglises ni de concile oecuménique possible, puisqu'il ne peut être convoqué, que jé sache ni par le sultan ni par aucun évêque particulier?". Du Pape, 1.IV, c. 6. Ed. 1819, p. 597. O teste espetáculo da divisão e dissolução dogmática que, passados apenas quatro séculos, oferecem hoje as seitas protestantes, são a mais dolorosa confirmação experimental da necessidade inelutável de uma autoridade suprema e infalível da Igreja. Sobre a anarquia protestante, cfr. o que diremos no 1. II, c. 3.___

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este chefe é entre os sacerdotes o bispo... entre os bispos o metropolita... entre todos, o bispo romano... Esta ordem deve ser permanente na Igreja porque contínua é a sua razão de ser: o perigo do cisma”.5

Nada mais claro. Concluamos. A razão exige um primado perpétuo? Cristo instituiu-o. Tudo na obra divina é coerente. O edifício da Igreja foi levantado sobre a firmeza de uma autoridade que, como rocha inabalável, lhe há de sustentar a divina estrutura até a consumação dos tempos. "Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja e as portas do Inferno não prevalecerão contra ela".

A palavra onipotente do Verbo humanado prometeu naquele instante ao humilde pescador da Galiléia uma investidura imortal. Pedro viverá nos seus sucessores até o fim dos tempos. "Episcopalis dignitas Petri indeficiens obtinet cum aeterno sacerdotio consortium".6 Estas palavras de S. LEÃO MAGNO recolhem na sua concisão a voz de todas as gerações cristãs, que, neste sentido, entenderam sempre a instituição do divino Fundador. Não é dos lábios profanados e indignos dum sacerdote fedífrago, perjuro e rebelde que iremos ouvir após mil e quinhentos anos a interpretação genuína da magna carta que constitui o princípio de estabilidade, desenvolvimento e perfeição da sociedade cristã.

A Igreja fundou-se, organizou-se, desenvolveu, segundo o ideal preestabelecido pela Providência. Não podia falhar o plano de Cristo à espera de LUTERO que o viesse emendar. A constituição social do cristianismo e a sua vida no curso dos séculos são necessariamente a realização do plano divino. Ora, desde os seus primórdios a Igreja reconheceu sempre o pontífice romano como o legítimo sucessor de S. Pedro no governo supremo e universal da sociedade dos fiéis. É este concerto admirável da consciência cristã que passamos a ouvir. Depois dos oráculos do Evangelho, depois dos ensinamentos da razão, escute-se a lição da história.
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5. HUGO GROTIUS, Votum pro Pace, ad art. 7. Opera Theologica, Basileae 1732, t. IV. P. 658. Cfr. LEIBNIZ, System der Theologie, Mainz, 1825, p. 296. "A supressão da autoridade do Papa, observa ainda outro célebre jurista protestante, lançou no mundo os germes de discórdias infinitas. Sem autoridade suprema para por termo às discussões que de todos os lados se levantam, começaram os protestantes a dividir-se e dilacerar-se as entranhas com as suas próprias mãos (Funere protestantes in sua ipsorum viscera coeperunt)". PUFFENDORF, De Monarchia Pontifices Romani. Podem consultar-se outras citações de autores protestantes colidas por DE MAISTRE, Du Pape, c.9.

6. S. LEÃO MAGNO, Sermo V (ML, LIV =. 155).
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O legítimo sucessor de S. Pedro na voz da história. - Cristo, já o deixamos largamente demonstrado, instituiu uma sociedade religiosa, deu-lhe em Pedro e em seus sucessores uma autoridade suprema e indefectível, guarda da sua doutrina, baluarte inconcusso da sua unidade. Ora, a autoridade, de sua natureza, é o elemento mais visível, mais conspícuo, mais saliente no organismo social. Se ignoro onde reside o poder, como lhe posso prestar submissão? Como posso apelar para as suas decisões nas minhas dúvidas? Como conhecer a legitimidade dos seus decretos? Logo, fechando o silogismo, na verdadeira Igreja de Jesus Cristo deve existir sempre uma autoridade suprema, visível, evidentemente reconhecível às inteligências retas e aos corações sinceros.

Lançai agora um olhar sobre o universo cristão. Onde está o grande centro da unidade católica, a grande força moral que afirma serenamente a supremacia da sua jurisdição baseada na herança legítima da supremacia de Pedro? Todos os olhos se voltam expontaneamente para a cidade eterna: ei-lo; o bispo de Roma é o soberano Pontífice da cristandade.

Fora da comunhão católica encontrareis mil seitas que se dizem cristãs, a definharem na estagnação da morte, sem unidade de fé, sem unidade de regime, sem unidade de culto. Outrora eram ramos florescentes da grande árvore. O orgulho separou-as num momento de desvario; a ignorância e os preconceitos continuaram a obra cismática das paixões em revolta. Foram-se, desditosas igrejas! Mas nenhuma, ainda nos dias de sua maior enfatuação, pretendeu a hegemonia universal na sociedade dos crentes.

As velhas igrejas do Oriente proclamaram-se espontaneamente autocéfalas. Cada patriarca não estende a sua jurisdição além da limitada esfera territorial que lhe assinaram as conveniências políticas, os acordos diplomáticos ou as transações financieras.7 Sofia e Atenas, Moscou e Bizâncio tratam-se como potências políticas autônomas, nem sempre aliadas mas sempre no mesmo pé de igualdade.

O protestantismo, outra fração separada da unidade católica, introduziu na hierarquia eclesiástica, como em tudo o mais, um confusão inextricável. HENRIQUE VIII disse: "Não quero papa porque o supremo poder espiritual sou eu; a tiara, e a coroa devem

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cingir a mesma fronte. Mas haja bispos, indepoendentes entre si e dependentes do cetro, sem nenhuma autoridade fora da Inglaterra. LUTERO amputou mais profundamente: não quero bispos, mas só sacerdotes. CALVINO mais radical ainda: nem bispos nem sacerdotes, só ministros predicantes. Uma multidão de seitas inferiores: fora também os ministros predicantes; cada cristão é o seu doutor e o seu profeta. Toda a reforma, portanto, nas suas infinitas modalidade renuncia à posse do governo supremo das almas. E eis-nos chegados às pontas do dilema: ou a Igreja de Cristo, por ele fundada sobre Pedro pereceu, ou é a Igreja Católica, Apostólica, Romana.

Para justificar ante a consciência cristã a existência do papado não é mister acumular outras provas, cerrar mais argumentos, ou multiplicar novas deduções. A infalibilidade da palavra de Cristo que prometeu a indefectibilidade à sua Igreja edificada sobre Pedro é o título divino da existência do papado, o penhor seguro da sua perene dedução.

Mas vamos à prova histórica. Para o Sr. CARLOS PEREIRA, o Papado não é instituição do cristinismo primitivo, é "o elo último de uma evolução secular, a expressão suprema de uma concentração sucessiva do poder", p. 295. Mais: "instituição essencialmente humana, o Papado é a suprema mistificação do Cristianismo legada aos tempos modernos pela superstição caliginosa dos tempos medievais".8 - Nunca se levantou mais flagrante testemunho contra a história. O Papado nascido na Idade Média! Mas o Sr. CARLOS
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8. É realmente deplorável como fala o Sr. CARLOS PEREIRA da Idade Média. Não lhe sai a expressão da pena sem que lhe não afivele um epíteto escuro: caliginoso, tenebroso, etc. Isto em pleno século XX! Mas que homem medianamente culto, se o não cega de todo a paixão sectária, desconhece hoje os grandes trabalhos históricos com que o século passado reabilitou a Idade Média ignobilmente denegrida pela Renascença e pelo protestantismo que a ignoravam? Só quem de todo não estudou esta quadra gloriosa que levantou as catedrais, pensou a Suma Teológica e cantou a Divina Comédia, pode malsiná-la de obscurantista. Mas as trevas não estão na época de que se escreve, estão na inteligência de quem escreve. E se não há trevas no espírito há malícia na vontade. Nada mais cômodo à polêmica sem escrúpulos do que este grande negrume do meio, origem obscura de tudo o que molesta, berço desprezível de tudo o que se rejeita como supersticioso, imensa vacuidade de onde se sacam as explicações mais inverossímeis para dar razão de tudo... até do Papado. Mas infelizmente, na ciência séria e cônscia de sua missão, estes recursos já passaram da moda. Hoje crêem no obscurantismo medieval o Sr. CARLOS PEREIRA... e os autores de textos para as escolas leigas de França. A história honesta usa outra linguagem: Nos historiens... s'arrêtant aux plus grossières apprences, écoutant les préventions les plus orannées, n'avant pas même la pensée de rectifier, encore moins le désir de vérifier les vieilles allégations, o t? résumé l'histoire de la première moitié du Moyen Age par ces dont mots: ignorance et superstition. Mais c'est à eux et non aux siècles qu'ils ont...(ilegível-nota do digitador)" DAREMBERG, I'histoire des Sciences médicales, Paris 1870, t.I, pp. 254-255.
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PEREIRA abriu alguma vez um compêndio de história eclesiástica? Compulsou os documentos e as fontes dos primeiros séculos do cristianismo? Leu as Atas dos Concílios? Manuseou as obras dos antigos Padres: Não? E por que se põe a escrever e a doutrinar as turbas erigindo cátedra de sabedoria teológica? Sim? E que faz então da consciência cristã e da probidade científica?

Escrevêramos volumes se quiséramos recolher todos os testemunhos e fatos históricos da antiguidade que atestam irregrafavelmente a supremacia espiritual do papa. Não é, porém, necessário nem aqui nos fora possível. Estes volumes já foram escritos pela erudição mais compreensiva e pela crítica mais escrupulosa. Não os devera ignorar quem pretende impugnar o papado. Mas tudo isto é "graecis incognitum qui sua tantum mirantur".

Demais, apertados nos estreitos limites de algumas páginas não nos é permitido senão aduzir os depoimentos de maior autoridade, os fatos de alcance mais significativo. Cingir-nos-emos aos cinco primeiros séculos do cristianismo, isto é, ao intervalo que se estende da idade apostólica ao início desta era fosca e obscura, em cujas tenebrosas oficinas a "superstição caliginosa" forjou "o grande ídolo do Vaticano", "suprema mistificação do cristianismo".

A quem lê despreocupadamente a história da Igreja, um duplo fato, constante e universal, para logo lhe atrai profundamente a atenção: de um lado, nos papas, a consciência firme, tranquila, ininterrupta da sua autoridade; do outro, na Igreja, a consciência segura, confiante, luminosa da plenitude do poder divinamente outorgado ao seu chefe.
Aos fatos.

Estamos na idade apostólica. O espírito turbulento de alguns jovens suscita em Corinto distúrbios e desavenças. A paz dos fiéis é seriamente ameaçada. Quem a restabelece? O bispo de Roma. S. CLEMENTE, terceiro sucessor de S. Pedro, escreve aos coríntios palavras afetuosas e paternas sim, como convém ao pastor comum, mas, ao mesmo tempo, repassadas de força e autoridade como só as pudera escrever um superior.9 Com a carta envia também o papa
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9. "Os que não obedecem ao que ele [Cristo] por nosso órgão diz, saibam que hão de incorrer em falta e envolver-se em não pequeno perigo; nós seremos inocentes deste pecado". Epíst. ad Corinth., c. 59 (F. 12, 135). Abertamente declara S. CLEMENTE: 1.º que Cristo fala pelos seus lábios; 2.º que os renitentes serão réus de grave culpa. Haverá modo de afirmar menos ambiguamente a própria autoridade? S. IRINEU referindo-se a esta epístola chama-a "potentissimas litteras, ad pacem eos [coríntios] congregans et reparans fidem eorum". Adv. Haeses., III, 3, 3, (MG, vii, 850).___

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os seus legados para compor o dissídio. A eficácia da intervenção não se fez esperar. Restabelecida a harmonia, por muitos anos continuaram os coríntios a ler publicamente nas suas igrejas, durante o ofício divino, a epístola do sucessor de Pedro. Este fato, em que Roma intervém autoritativamente numa igreja distante, de origem apostólica, em vida de S. João, a quem fora mais pronto e natural o apelo, é testemunho de tanto peso que os próprios protestantes não lhe podem obscurecer a importância. LIGHTFOOT vê neste intervento "o primeiro passo para a dominação papal".10 CARLOS PEREIRA em pessoa confessa que este documento "respira um certo tom de superioridade", p. 304. Mas logo dele se descarta com esta chocha observação: "de resto, epístolas como estas escreveram-nas Inácio de Antioquia, Policarpo de Esmirna, Dionísio de Corinto e Irineu", p. 304. Epístolas, sim; como esta, não. Por que o esforçado apologeta não tomou sobre si a tarefa de mostrar-nos nestas outras epístolas: "o tom de superioridade que respira a do bispo de Roma"? O próprio gramático não estava convencido desta igualdade de tom, porquanto logo a seguir, acrescenta: "Ela [a epístola de Clemente] apenas indica a direção em que soprava o vento". Creio que prova algo mais. Mas arquivemos a preciosa confissão: desde a primeira idade da Igreja, vivendo ainda o discípulo predileto, quando ainda soava aos ouvidos dos fiéis o eco da pregação apostólica, o vento que soprava dirigia-se para Roma a indicá-la como sede da autoridade religiosa. O homem que faz agora esta confissão é o mesmo que páginas antes escrevera: "No governo... da Igreja cristã primitiva, nada há que, sequer de longe, se aproxime do papismo da Igreja latina", p. 295.11 No segundo século, por vontade de S. VÍCTOR (189-199) papa em todo o orbe cristão se reúnem sínodos a fim de uniformizar a celebração da Páscoa na Igreja e alguns bispos da Ásia se vêem ameaçados de separação da comunhão católica se recusassem aceitar o costume de Roma. Diante deste fato os protestantes NEANDER,
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10. "Undoubtelly... the first step owards papal domination". LIGHTFOOT. S. Clement. of Rome, Londrina, 1890, I. p. 70.

11. Papismo! Como destoa num estudo "histórico-dogmático" ouvir ainda estas denominações pejorativas, filhas de velhos ódios. A Igreja que obedece ao Papa não tem sobrenomes humanos; toda a gente a conhece com o nome de Igreja Católica. As alcunhas de papismo e romanismo, com que a quiseram ridicularizar os protestantes, não vintgaram contra o bom senso da humanidade. Eles serão sempre luteranos, calvinistas, zeuinglianos, etc., etc. A revoltosos bem está o nome de um cabecilha revolucionário. Ela será sempre a Igreja Católica. O apelido de papismo "est encore ce qu'il fut toujours, une pure insulte et une insulte de mauvais ton qui, chez les protestants même, ne sort plus d'une bouche distinguée" DE MAISTRE, Du Pape, 1. VI, c. 5. Ed. 1819, p. 586.
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LANGEN e HARNCK reconhecem que realmente VICTOR já se atribuia uma jurisdição sobre toda a Igreja. CARLOS PEREIRA, irrita-se contra o santo Pontífice que deu a vida pela fé. Aos seus olhos obnubilidados pelo preconceito, VICTOR não passa de um "atribiliário bispo de Roma", p. 309, com o qual "bem cedo se revela o vírus romano que tem de explodir em Leão, Hildebrando, Bonifácio e Inocêncio, e consumar-se em Pio IX", p. 305. - Como poderá conhecer a verdade quem tão apaixonadamente lê e desfigura a história? Longe dos documentos, CARLOS PEREIRA rejeita o papado como superfetação da caliginosa Idade Média: "Por quase quatro séculos não deparam sequer vestígios, nenhuma tradição, nem um simples monumento da antiguidade", p. 301, que perpetue a memória do papado. Apresentam-se-lhe os documentos, autênticos, antiquíssimos, firmados por nomes de homens que deram o sangue pela integridade de sua fé e que a Igreja inteira venera com amor? O protestante exalta-se, atira para longe os documentos porque infeccionados com o "vírus romano", cobre de baldões a memória dos seus autores tomados de acessos de abrabílis. Haverá modo de persuadir semelhante adversário?

Prossigamos. No primeiro quartel do terceiro século, S. CALISTO (219-224) afirma-se como bispo dos bispos, promulga um decreto para regularizar na África a prática da confissão, legisla sobre a deposição dos bispos, condena a heresia dos Patripassianos.

S. ESTÊVÃO (154-257) dirige com a sua autoridade a célebre controvérsia agitada na Ásia e na África sobre a repetição do batismo conferido pelos hereges.

No século IV, JÚLIO I (337-352) recebe a apelação do S. Atanásio, patriarca de Alexandria, de Marcelo de Ancira, de Paulo, patriarca de Constantinopla, e a alguns bispos que precipitadamente se haviam imiscuído nessas igrejas escreve: "Ignorais ser costume que primeiro se nos escreva e daqui se decrete o que for justo? Certo, se alguma suspeita podia pairar sobre estes bispos, a esta Igreja [Roma] se devera ter comunida".12 Dos bispos, assim ilegitimamente depostos, vários foram, em seguida, por ordem pontifícia, reintegrados nas suas sedes. Que melhor argumento da primazia de Roma que este antigo costume de lhe obedecerem os bispos e patriarcas assim do Ocidente como do Oriente?
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12. S ATHANASIUS, Apolog. c. Arian., n. 35 (MG, xxv, 307).__

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S. SIRÍCIO (334-398) declara pesar-lhe sobre os ombros, como sucessor de Pedro, a solicitude de toda a Igreja; para toda a Igreja legisla e dirime controvérsias: "A regra acima [sobre a administração do batismo], escreve ele, deve ser observada por todos os bispos que se não quiserem separar da solidez da pedra sobre a qual Cristo edificou sua Igreja".13
À medida que a literatura eclesiástica se vai opulentando de mais copioso cabedal de documentos, os testemunhos da primazia pontifícia se vão multiplicando prodigiosamente. Das primitivas eras do cristianismo, falhas e escassas são as memórias que nos restam. Sumiu-se em grande parte a voragem dos tempos.14 E de si já não podiam ser muito numerosas numa quadra tão difícil e arriscada em que a profissão de fé constituia um perigo capital e a vida religiosa dos fiéis, sem lograr a luz da publicidade, se desenvolvia, silenciosa e retraída, à sombra amiga das catacumbas. Com a paz religiosa, porém, inaugura-se a idade de ouro da literatura cristã e o historiador vê satisfeito lourejar ante seus olhos uma seara magnifífica de preciosas informações.

Entremos no século V, INOCÊNIO I (402-417). ZÓZIMO (417-428), BONIFÁCIO I (412-422), CELESTINO I (422-432), LEÃO MAGNO (440-461), SIMPLÍCIO (468-483), FÉLIX II (483-4923) E GELÁSIO I (492-496), isto é, quase todos os papas do século deixaram-nmos tnatos, tão conepícuos, tão incotnratáveis documentos de sua autoridade jurisdicional que a dificuldade está só em os escolher. Ao Concílio de Cartago escreve INOCÊNCIO I que o julgamento dos bispos não é definitivo "se o não confirma a autoridade da sede apostólica". Assim o ensinam "a antiga tradição e a disciplina esclesiástica" estribadas não em disposições humanas, mas na "sentença divina".15 ZÓZIMO, numa epístola aos bispos africanos, recorda outrossim "a tradição dos Padres", consoante a qual a ninguém é lícito discutir as sentença da Sé apostólica; a Pedro e a seus sucessores " por promessa de Cristo e por lei divina" foi confiada a solicitude da Igreja universal.16 Escreve BONIFÁCIO I a todos os bispos da Tessália: é certo por palavra divina que a Igreja romana é a cabeça de todas as igrejas disseminadas no mundo: "quem dela se aparta
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13. P. COUSTANT, Epistulae Romanorum Pontificum, Paris, 1721, p. 627.

14. É sobretudo lamentável a perda dos arquivos da Igreja Romana, destruídos por Diocleciano.

15. COUSTANT, Op. Cent., p. 888 ss.

16. COUSTANT, Op. Cent., p. 974 ss.
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desmembra-se da religião cristã porque já lhe não pertense à constituição orgânica".17 A S. CIRILO de Alexandria ordena S. CELESTINO que, em seu nome e por autoridade da Sé apostólica,excomungue e deponha a NESTÓRIO, patriarca de Constantinopla, caso não retrate os seus erros; confere-lhe ao mesmo tempo a faculdade de nomear outro bispo e lhe comunica haver já escrito no mesmo sentido a outros membros do episcopado a fim de que "a todos conste a sua sentença que é a sentença divina de Cristo".18

Não queremos fatigar o leitor multiplicando alegações, qual mais explícita, mais insofismável, mais decisiva. Não há escurecer a evidência. Os papas sempre tiveram a consciência luminosa, segura, tranquila da sua suprema jurisdição sobre a Igreja. Em todos os monumentos históricos, nenhum vestígio de dúvida que hesita, nenhuma sombra de inovação humana que se pretende introduzir. É um apelar constante para a antiga tradição dos Padres, um reportar-se contínuo à promessa de Cristo, à instituição divina e perpétua do primado na pessoa de Pedro e dos seus legítimos sucessores na cátedra de Roma.

E a Igreja? Levanta-se, porventura contra essa autoridade como usurpação humana que vem desfigurar e desnaturar a obra divina de Cristo? Insurge-se, talvez contra esta força moral, superior à de todos os bispos, de todos os patriarcas, de todas as igrejas particulares? Muito longe disso. Não há um brado de protesto. Na consciência da Igreja, assistida sempre pela divina Providência, vive o espírito de fé, de submissão, de confiança no governo divinamente constituído do papa.

Quereis ouvir a voz dos Padres e dos grandes doutores?

É INÁCIO (m. 107 ou 117), bispo de Antioquia, contemporâneo dos Apóstolos, que, saudando aos Romanos, parece não encontrar no entusiasmo do seu fervor termos bastante expressivos para exaltar a grandeza singular desta Igreja que de Roma preside à comunhão universal dos fiéis e a cuja solicitude confia os cuidados da igreja de Esmirna, que, com o seu martírio, ficaria em breve viúva do seu pastor. 19 E qual é a missão desta Igreja "que preside a toda
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17. COUSTANT, Op. Cent., p. 1037

18. COUSTANT, Op. Cent., p. 1106

19. "Ignatius... ecclesiae dilectae et illuminatae voluntate eius qui vult omnis quae sunt secundum caritatem Jesus Christi Dei Nostri; quae etiam paesidet in loco regionis romanorum, digna Deo, digna decore, digna quae sancta predicetur, digna laude, digna, quae voti compos fiat, digne casta et universo caritatis, coetui praesidens, Christi legem habens, Patris nomine insignita, etc.". Ad Rom. (F. I(2), 213), "Solus Jesus Christus illam [ecclesim Syriae] vice episcopi reget atque vestra caritas". Ad Rom., IX, I (F, I(2), 223). Fora mister ler toda esta epístola, respirar este sentimento de reverência que de toda ela se exala para formar uma idéia do alto conceito em que na idade apostólica era tida a primazia da igreja romana.
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a cristandade"? Continua o santo mártir: "Vós ensinastes às outras igrejas. E eu quero que permaneçam firmes as coisas que vós prescrevestes nos vossos ensinamentos".20

É IRINEU (m. 202), oriundo da Ásia Menor, bispo nas Gálias, discípulo de S. Policarpo e de outros anciãos da idade apostólica, Irineu em cujo testemunho falam o Oriente e o Ocidente e que proclama sem rebuços nem equívocos a necessidade para todas as igrejas de se conformarem na fé com a Igreja romana em razão de sua primazia de poder.21

É CIPRIANO (200-258), que, comunicando ao papa Cornélio a partida para Roma de Felicíssimo e outros cismáticos, diz: "Atrevem-se estes a dirigir-se à cátedra de Pedro, a esta igreja principal de onde se origina o sacedócio... esquecidos de que os romanos não podem errar na fé".22 Para O bispo de Cartago, Roma é "a matriz e o tronco da Igreja católica",23 "estar em comunhão com o papa é estar em comunhão com a Igreja católica".24É AGOSTINHO (354-430), que em mil lugares, atesta inequivocamente a supremacia do Pontífice romano. Roma é a igreja "in qua
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20. Ad Rom., III, I, (F I(2), 215).

21. "Ad hanc enim Ecclesiam propter potentiorem principalitem necesse est omnem convenire ecclesiam". Adv. Haer., III, 3 (MG, VII; 849). Eis na íntegra vertido o texto de IRINEU: "Com esta igreja, em razão de sua primazia de poder todas as outras igrejas, isto é, os fiéis de todo o universo têm obrigação de se conformar: de fato, é nela que todas, em toda parte e sempre, conservaram a tradição que vem dos apóstolos".. "Il est difficile de trouver une expression plus nette: 1º de l'unité doctrinale dans l'Eglise universelle; 2º de l'importance souveraine, unique de l'Eglise romaine comme témoin, gardienne, et organe de la tradition apostolique; 3º de sá prééminence supérieure dans l'ensemble des chrétientés". DUCHESNE, Eglises séparées, Paris 1905, p. 119.

22. Epist. 59, n. 14 (Ed Hartel, 683).

23. Epist. 49, n. 3 (Hartel, 607).

24. Epist. 55, n. 1 (Hartel, 624). Tal é o sentir de Cipriano, calmo e tranquilo, ecoando a grande voz da tradição católica. Que montam algumas expressões ressentidas pronunciadas depois pelo grande bispo contra o papa S. Estêvão no ardor de sua controvérsia religiosa que agitou e perturbou os ânimos na África e na Ásia? Magnificamente DE MAISTRE: "
Lorsque les adversaires de la monarchie pontificale nous citent usque ad nauseam les vivacités de ce même S. Cyprien contre le papa Etienne, il nous peigent la pauvre humanité au lieu de nous peidre la sainte tradition... Il faut de plus ne jamais perdre de vue cette grande règle qu'on néglige trop, en traitant ce sujet,quoiqu'elle soit de tous les temps et de tous les lieux, que le témoignage d'un homme ne saurait être reçu, quelque soit le mérite de celui, qui le rend, dès que cet homme peut êntre seulement, soupçonné d'être sous l'influence de qualquer passion capable de le tromper". Du Pape, l.I, c.8 Ed. 1819, pp. 70-68. ___________
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sempre apostolicae viguit principatus".25 A sede de Pedro, pelo sucessão ininterrupta de seus bispos, "culmen auctoritatis obliunt, cui nolle primas dare vel summae profecto imietatis est vel praecipitis arrogtantiae". 26

É JERÔNIMO (340-420) que das longínquas paragens do Oriente, ao ver que Melécio, Vital e Paulino pleiteavam a sede de Antioquia, se dirige ao Papa em demanda de luz e conselho: "estar em comunhão com o romano Pontífice é estar unido à cátedra de Pedro, é sequir a Cristo, que sobre essa pedra edificou a sua Igreja. Quem sair desta arca perecerá no naufrágio". 27
É, ainda OPTATO DE MILÉVIO, AMBÓSIO, GREGÓRIO DE NAZIANZO, MARCELO DE ANCIRA, VICENTE DE LERINS, PEDRO CRISÓLOGO, TEODORO, LEÔNCIO DE ARLES,28 é o coro universal da Igreja, do Oriente e do Ocidente, a cantar harmoniosamente as glórias de prerrogativas de Pedro sempre vivo nos seus sucessores.

Tal a voz dos Padres. Ouvi agora a dos Concílios. É a Igreja toda que fala nas suas assembléias ecomênicas.

Abre-se em 431 o concílio de Êfeso. FILIPE, legado do Sumo pontífice assim se apresenta ao venerável consenso: "Ninguém duvida, a todos os séculos o confessam, que S. Pedro, príncipe e chefe dos apóstolos coluna da fé e fundamento da Igreja católica, recebeu de N. S. J. C., Salvador e Redentor do gênero humano, as chaves do reino e o poder de ligar e desligar os pecados. Pedro vive e julga até aos nossos dias e sempre viverá e julgará na pessoa de seus sucessores. S. CELESTINO, seu sucessor e substituto legítimo, nosso santo e bem-aventurado Papa, a este sínodo me envia como seu representante, etc."29 E todos os padres do concílio expressamente aprovaram as palavras do enviado pontifício.

Vinte anos depois, no concílio ecumênico reune-se em Calcedônia. Logo na priemira sessão levanta-se o representante do Soberano Pontífice e, sem que se ouvisse uma só voz de protesto,
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25. Epíst. 43, c. 3, n. 7 (ML, XXXIII, 163).

26. De util.credendi, c. 17. n. 35 (ML, XLII, 91).

27. "A pastore praesidium ovis flagito... Ego nullum primum, nisi Christum sequens, Beatitudinae tuae, id est, cathedrae Petri communione consorcior. Super illam petram aedificatam Ecclesiam scio. Quiqumque extra hanc domum agnum comederit, profanus est. Si quis in arca Noe non fuerit peribit regnhante diluvio... Quicumque tecum nom colligit, spagit!. Epist., 15, n. 2 (ML, XXII, 355).

28. Muito alongaríamos estas páginas se quiséramos referir, um por um, todos os lugares destes e de outros doutores dos cinco primeiros séculos da Igreja, que preconizam e exaltam a primazia do Papa. O leitor poderá consultá-los nas obras que citaremos em bibliografia, no fim do livro I.

29. MANSI, IV, 1295-B.
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pronuncia as seguintes palavras: "Devo comunicar-vos uma ordem do Papa da cidade de Roma que é o chefe de todas as igrejas, com a qual proíbe que Dióscoro toma parte no Concílio". 30
Consultai igualmente os atos do 3.º concílio de Constantinopla, do 2.º concílio de Nicéia, do 4.º concílio de Constantinopla31 e ver-se-á sempre a mesma crença da Igreja universal autenticamente professada nas suas mais imponentes assembléias.
Calo de indústria os concílios posteriores e cito de preferência os orientais a fim de que o leitor possa julgar com quanta verdade afirma o Sr. PEREIRA que "as pretenções do bispo de Roma de ser o chefe universal da Igreja em tempo nenhum foram reconhecidas pela catolicidade cristã. As igrejas do Oriente protestaram contra esta sacrílega usurpação e as do norte da Europa repetiram este protesto no século XVI", P. 309. Esqueceu ao prudente polemista advertir os seus leitores que a grande tentavia de cisma geral no Oriente, devida à ambição de FÓCIO, data do séc. IX. Morto FÓCIO a fração cismática voltou à unidade católica, da qual foi novamente separada no séc. XI por MIGUEL CERULÁRIO. Dois séculos depois ainda uma vez as Igrejas do Oriente e do Ocidente subscreveram no concílio geral de Lião (1245) o dogma do primado do papa. Só o orgulho dos imperadores e a cobiça insaciável dos patriarcas de Constantinopla levaram de novo o Oriente à via funesta do cisma. Sinceramente, depois de nove séculos de cristianismo "o protesto contra a usurpação sacrílega" vem muito tarde. O Sr. CARLOS PEREIRA, que não perde ocasião de mostrar sua ogeriza com tudo o que é medieval, por que agora acolhe sem reservas uma separação operada "nas tevas caliginosas" desta idade de superstições? Por que não nos mostra o protesto do Oriente cristão na sua idade de ouro, quando nele florsciam os CRISÓSTOMOS, os NAZIANZENOS, OS ATANÁSIOS, quando nos seus concílios se recebiam os legado do Papa com a aclamação unânime: Pedro falou pelos lábios de Leão? Nascidos de uma paixão mal sofreada os protestos de FÓCIO e de LUTERO não passam de gritos vulgares de revolucionários criminosos. Não é a consciência, é o interesse, é a soberba, é o amor próprio mal ferido que inspiraram os dois grandes cismas que romperam a unidade cristã.32 Sobre os seus autores pesa na história o cargo das mais terríveis responsabilidades.
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30. MANSI, VI, 579-D

31. MANSI, XI, 659-C; XII, 1081-D; XVI, 325-B.

32. É verdade tão sabido que qualquer insistência pode parecer supérflua. FÓCIO reconheceu a primazia do Papa enquanto este não lhe foi à mão no seu desmesurado desejo de subir. Só então, irritado, entrou a combater a supremacia de Roma sob o religiosíssimo pretexto de que a autoridade eclesiástica devia acompanhar a dignidade de capital do império, transferida do Tibre para o Bósforo. Note, pois, o Sr. CARLOS PEREIRA: Fócio não negou a primado, não quis destruir a tiara, desejou cingi-la. - Em LUTERO é ainda mais evidente a influência do ânimo apaixonadamente orgulhoso. Desde 1516 errara o frade teólogo em expor a doutrina católica da justificação. Impugnado pelos defensores da ortodoxia apelou para Roma. Em 30 de maio de 1518 envia ao Papa suas teses ou resolutiones, que deviam ser acompanhadas com uma carta em que se lêem estas formais palavras: "Agora, que devo fazer? Desdizer-me não posso, e vejo entretanto que excitei grande ódio e inveja com publicar estas minhas teses... [e conclui:] Por isso, santíssimo Padre, prostro-me aos pés de vossa Santidade, a quem entrego a minha pessoa, tudo o que sou e tenho. Vossa Santidade fará o que bem apouver: nas mãos de V. S. está o repelir ou defender a minha causa, dar-me, ou negar-me razão, dar-me a vida ou tirar-ma. Na voz de Vossa Santidade reconheço a voz de Cristo, que em vós fala e governa". DE WETTE, I, 121-122. e, 1519 diz ainda nume epístola ao Papa: "plenissime confiteor hujus Ecclesiae (romanae) potestatem esse super omnia" DE WETTE, I, 234. O Papa, guarda infalível da verdade, não podendo transigir com o erro, condenou-o. O frade soberbo não teve a humildade de submeter o seu juízo à autoridade daquele a quem Cristo confiara a missão de confirmar os seus irmãos na fé. Inde irae!
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Reatemos a fio da nossa demonstração. Mais eloquentes que as palavras são os fatos. A vida toda da Igreja gravita em forno de Roma. Imaginai, por um instante, que o Papa nos seja sucessor de S. Pedro no governo universal das almas e toda a história eclesiástica se torna um mistério inexplicável, um enigma sem solução.

É o Papa quem convoca, preside e confirma todos os concílios gerais desde o de Nicéia até ao do Vaticano.33 Seu poder sobre estas assembléias ecumênicas é univesalmente reconhecido. LEÃO I cassa o cânon 28 do concílio de Calcedônia e o cânon fica sem efeito. "Convocar um sínodo sem autoridade da Sé apostólica, proclamam os legados do Papa no 4.º concílio ecumênico na presença 600 bispos orientais, é coisa que nunca se fez nem é lícito fazer".34
É o Papa quem confirma, remove, demite, reintegra bispos no Oriente e no Ocidente. CIPRIANO escreve a S. ESTÊVÃO para que substitua MARCIANO, bispo de Arles. S. DÂMASO depõe FLAVIANO, patriarca de Alexandria. S. AGAPITO exautora ANTIMO, patriarca de constantinopla, apesar da oposição da imperatriz. NICOLAU I enumera oito patriarcas constantiopolitanos depostos pelos Romanos Pontífices. ATANÁSIO, patriarca de Alexandria, EUSTÁTIO, bispo na Armênia e TEODORETO depostos em sínodos provinciais ou gerais são restituídos às suas sedes por ordem de Roma. E o poder
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33. Acenamos aqui muito de corrida a uma multidão inumerável de fatos. Referi-los por miúdo e documentá-los copiosamente fora escrever um tratado inteiro de história eclesiástica. Não adiantamos, porém, uma só proposição de que não possamos, se nos for contestada, ministrar todas as provas históricas.

34. MANSI, VI, 582-B

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do Papa "em tempo nenhum foi reconhecido pela catolicidade cristã"!

É o Papa quem acredita, nos centros mais importantes da cristandade, legados e embaixadores seus, investido de plenos poderes para decidir as causas mais urgentes. LEÃO I nomeia um apocrisiário em Constantinopla, AGAPITO um representante junto ao imperador JUSTINIANO. Em Tessalônica desde o século IV residia um vigário apostólico cuja jurisdição se estendia a todos os bispos da Ilíria.

Ao Papa, de todo o orbe católico apela, sem distinção, sacerdotes, bispos, patriarcas, ortodoxos e hereges. Roma é o tribunal de última instância. Sua sentença pode reformar todas as outras e por nenhuma e reformável. Em 142 MARCIÃO, excomungado pelo seu bispo no Ponto; em 251, PRIVATO, bispo condenado pelo concílio de Cartago; em 252 FORTUNATO e FÉLIX, julgados por CIPRIANO, apelam para Roma. Para Roma apelou o grande ATANÁZIO, patriarca de Alexandria, apelaram CRISÓSTOMO, GREGÓRIO DE NAZIANZO, e FLAVIANO, EUTIQUES, AÉCIO, todos orientais. Que melhor prova da supremacia do papa? Não escreveu CALVINO que "o supremo poder reside naquele para cujo tribunal se apela"?35 E a autoridade do papa "em tempo nenhum foi reconhecida pela catolicidade cristã"!

É na comunhão com o papa, necessária a todos os fiéis, que a Igreja põe a pedra de toque da verdadeira ortodoxia. Afirmam-no declaradamente S. CIPRIANO, S. OPTATO DE MILÉVIO, S. AMBRÓSIO, S. JERÔNIMO. Afirmam-no, com os fatos, quase todos os hereges que, ainda condenados por bispos ou sínodos particulares procuraram com todas as artes da fraude, da dissimulação e da astúcia conservar a comunhão com a Igreja romana. Basta lembrar os nomes de MARCIÃO, CELESTINO, amigo de PELÁGIO, MONTANO, etc.

Ao papa enfim reconhecem a soberania espiritual os supremos poderes políticos do império. GRACIANO no século IV ordena que não se entreguem as igrejas senão aos bispos em comunhão com papa DÂMASO.36 O edito de TEODÓSIO MAGNO que institui o cristianismo, religião do império, declara ser vontade do imperador que
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35. CALVINO, Institution de la Relegion Chrétienne, Lyon, 1565, I. e, c.7, n. 9, p. 390. Sobre as apelações dos orientais a Roma, Cfr. P. BERNADAKIS, Les appel au Pape dans l'Église grecque jusqu'à Fhotius, no Echos d'Orient, 1903, pp. 30-42; 118-126; 248-257; P. BATIFFOL, Les recours à Rome en Orient avant le concile de Chalcédoine, na Revue d'histoire ecclésiastique, 1925, pp. 5-32.

36. TEODORETO, Hist. Eccles., V. 2 (MG, LXXXII, 1198).

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os seus súditos "sigam a religião pregada por S. Pedro aos romanos e que até hoje se conserva e é seguida pelo papa DÂMASO".37 JUSTINIANO escreve a JOÃO II: "Apressamo-nos em levar ao vosso conhecimento tudo quanto concerne o estado das igrejas... Nem sofremos que coisa alguma seja desconhecida por Vossa Santidade quia caput est omnium sanctarum ecclesiaram".38
São imperadores cristãos? Pois não nos falta em testemunmho de imperador pagão. Chegou AURELIANO em 272 a Antioquia. PAULO DE SAMOSATA, já condenado por dois sínodos, recusava entregar a residência episcopal. A causa é levada ao tribunal supremo. A sentença de AURELIANO, que EUSÉBIO chama "retíssima", foi que se entregasse o edifício a quem determinasse o bispo romano e os outros antístites da Itália.39 Bem notória devia ser no século III a primazia do Papa sobre toda a Igreja para que não a ignorassem os próprios imperadores gentios.

Após esta rápida excursão pelos primeiros séculos do cristianismo podemos legitimamente concluir com DE MAISTRE: "Rian dans toute l'histoire ecclésiastique n'est ausse invinciblement démontré, pour la conscience, surtout, que ne dispute jamais, que la suprématie monarchique du souverain Pontife".40 Muito de caso pensado restringimo-nos quase exclusivamente aos testemunhos dos 5 primeiros séculos.41 Aqui é impossível falar de eclipse medieval, de obscurecimentos, de superstição.
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37. Cod. Theodos., I, 16, tit. I. c. 2.

38. Epist. 132, Epistolae Imperatorum, Pontificam, aliorum, etc., 1885-1888 p. 716.

39. EUSÉB., Hist. Eccles., VII, 30, (MG, XX, 719).

40. DE MAISTRE, Du Pape, I. I, c. VI, Ed. 1819, p. 44.

41. Não quero, porém, omitir aqui o testemunho de LUTERO, que de próprio punho lavrou a sua condenação. "É certo que Deus honrou a Igreja romana sobre todas as outras; nela S. Pedro, S. Paulo, 46 papas e milhões de mártires derramaram o próprio sangue e triunfaram da morte e do inferno... Não nego que o bispo de Roma seja, tenha sido e deva ser o primeiro: a esta persuasão leva-me, antes de tudo, a vontade de Deus que é visível em todo este fato. Se Deus não quisera, o Pontífice romano nunca teria chegado a esta monarquia. Ora, a vontade de Deus, de qualquer modo que nos seja significada, deve ser acolhida com respeito. Não é, pois, permitido resistir temerarialmente ao Pontífice romano na sua primazia. Tão poderosa é esta razão que, ainda, não houvesse, em seu favor, nenhum texto da Escritura e nenhum outro argumento, seria bastante forte para reprimir todos os que lhe resistem... Não vejo, como se possam esquivar à tacha de cismáticos os que, indo contra a vontade divina, se subtraem à autoridade do Romano Pontífice". Resolution lutherana super proposit. XIII de Potestate Papae, 1519. Weimar, II, 186. "A deferência que se deve a esta Igreja é evidente; se nos nossos dias em Roma as cousas se acham em todo estado que fora para desejar um regulamento melhor, contudo nem estas desordens nem outra causa alguma nos devem levar a separarmo-nos dela; muito pelo contrário, quanto mais deplorável é a condição atual das coisas, mais a ela nos devemos conservar apegados". Weimar, II, 72. Infelizmente a soberba mal dominada veio perturbar a serenidade do juízo que ditou estas linhas sensatas. A Igreja de Roma, regada pelo sangue de tantos mártires e tão manifestamente amparada pelo vontade de Deus, será mais tarde a apóstata, a grande prostituta de Babilônia, a sinagoga de Anticristo.
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Diante destes documentos e de mil outros que poderíamos facilmente produzir, perguntamos sinceramente a todo leitor desprevenido: havia ou não na Igreja primitiva a consciência clara, luminosa, serena da soberania esperitual do bispo de Roma?

Sem esta consciência, como explicar a história? E, sem ligar cinicamente a história, como a afirmação de CARLOS PEREIRA: "o papado, instituição essencialmente humana, é a suprema mistificação do cristianismo legada aos tempos modernos pela superstição caliginosa dos tempos medievais"?, p. 249. Ah! Mistificação" Ah! Superstição caliginosa!
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6 comentários:

  1. Há alguma explicação à "preferência" de Deus pelos italianos como papas? Lista consultada:http://www.paginaoriente.com/santos/papas.htm

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    1. celso muryloMar 15, 2012 01:00 PM
      Há alguma explicação à "preferência" de Deus pelos italianos como papas?
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      Quem lê os escritos dos primeiros cristãos (Patrística)sabe que o eles vivem neste mundo como peregrinos. Embora vivamos no Brasil - que nunca teve um correligionário papa - sabemos que a nossa pátria definitiva é o Céu. A maior quantidade de papas italiano decorre do fato de Roma ter sido a sede da qual levou os cristianismo a todos os povos.

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  2. E santos,também não há cononizados no Brasil.Será por causa da distância com a "santa Sé"?

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  3. Está por fora, amigo! Já temos dois santos brasileiros: Santa Paulina São Galvão.

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  4. Dos meus 38 anos passei 20 na "Igraja Deus é Amor" e 10 na "Assembléia de Deus"(que hoje eu não entendo que elas possam ser classificadas como legítimas igrejas cristãs).Hoje não frequento igreja,mas às vezes sinto vontade de me unir a uma comunidade cristã.
    Caso você possa me ajudar gostaria de saber se é verdade que o movimento pentecostal tem alguma relação com o movimento carismático(no surgimento de ambos) e qual sua opinião sobre o movimento carismático.Desde já obrigado e fique com Deus.

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    1. "A “Renovação Carismática Católica” era um desejo do coração do Papa João XXIII, ele expressava seus anseios da seguinte forma: 'Repita-se, pois agora, na família cristã, o espetáculo dos apóstolos reunidos em Jerusalém depois da ascensão de Jesus ao céu, quando a Igreja nascente se encontrou toda reunida em comunhão de pensamento e oração, com Pedro e em redor de Pedro, Pastor dos cordeiros e das ovelhas. Digne-se o Espírito divino escutar, de maneira mais consoladora, a oração que todos os dias sobe até Ele de todos os recantos da terra: Renova em nossos dias os prodígios como em um novo Pentecostes e concede que a Santa Igreja, reunida em unânime e mais intensa oração em torno de Maria, Mãe de Jesus e guiada por Pedro, propague o reino do divino Salvador, que é reino de verdade, de justiça, de amor e de paz. Assim seja. Amém!"

      O Concílio do Vaticano II desejava a renovação da Igreja, e a Renovação Carismática apareceu no momento em que procuravam colocar em prática essa ordem do Concílio. O Concílio foi encerrado pelo Papa Paulo VI, na Praça de São Pedro no dia 08 de dezembro de 1965, e em seguida começou-se a produzir no mundo inteiro um ressurgir dos carismas. Não se tinha passado nem um ano do término do Concílio, vários católicos - membros de faculdades da Universidade de Duquesne dos EUA, se reuniam freqüentemente para momentos fortes de oração e para conversar sobre a vitalidade de sua vida de fé. Os professores de Pittsburgh começaram a pedir em oração que o Espírito Santo lhes desse a renovação e rezavam uns pelos outros pedindo o Espírito Santo. De 17 a 19 de fevereiro de 1967, mais de 30 pessoas fizeram um retiro de fim de semana, o “Retiro de Duquesne”, em Pittsburgh nos EUA. Clamaram e receberam o Espírito Santo, experimentaram Pentecostes que marcou o ponto inicial da RCC no mundo" http://www.rccaltonia.com/arcc.php
      ============================
      Este movimento sempre esteve sob a rigorosa obediência à santa Igreja, prestando inestimável contribuição à expansão do Reino de Deus na terra, sendo, pois, injusta qualquer suspeita de rebelião. Enquanto permanecer em tal obediência, deverá ser apoiada e defendida por todos os católicos.

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