quinta-feira, 20 de maio de 2010

ONDE ESTAVA A IGREJA ANTES DE LUTERO? - IRC/LCP I-III-2


Livro I - A Igreja Católica'
Capítulo III - MAGISTÉRIO INFALÍVEL
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§ 2. - Corolário fatal.
'SUMÁRIO - Onde estava a Igreja antes de Lutero? Evasivas do Sr. CARLOS PEREIRA. - "Pias testemunhas da verdade".
'Da infalibilidade da Igreja que deixamos largamente demonstrada deriva um corolário fatal a todas as heresias. Qualquer grupo de Almas batizadas que se separa da comunhão dos fiéis e rompe com os ensinamentos e tradições antigas já está condenado pelo própria novidade. A Igreja de Cristo é una como a verdade. O Espírito Santo nela habita com a sua assistência continuada todos os dias, até a consumação dos tempos. Impossível assinalar uma época na história em que a Esposa do Verbo se tenha desviado da senda real da ortodoxia. As promessas divinas falhariam, Cristo deixaria de ser Deus e a religião por ele instituída afundaria para sempre no pego imenso das superstições humanas.

Após 15 séculos de cristianismo levanta-se um monge no coração da Alemanha e lança ao mundo o pregão de uma reforma. Simples regeneração de costumes? Não; reforma doutrinal. O que então se chamava doutrina cristã admitida pelo Igreja universal era uma adulteração profunda do Evangelho, um acervo de superstições e idolatrias, patrocinadas pelo anticristo de Roma. A Igreja se havia apartado da verdadeira fé: era mister reconduzi-la às fontes genuínas do Evangelho. Cristo errara a mão. Fundara uma sociedade fadada a destinos imortais. Plantara-a no mundo como cidade visível para acolher os eleitos. Mas, apenas saída das suas mãos divinas, apenas o mundo pagão, com a paz de Constantino viera buscar à sombra da cruz a verdade e a vida, a Igreja desfalece, corrompe-se, paganiza-se.19 Onze séculos de ignorância, de trevas e de superstições ensombraram a obra do Salvador. Foi mister que um frade apóstata, sensual e orgulhoso apontasse no horizonte religioso da humanidade para reconduzi-la aos mananciais cristalinos do Evangelho, e, mais feliz, mais próvido, mais sábio, mais poderoso que o Cristo, fundasse uma nova Igreja de vitalidade menos efêmera, Igreja imorredoura e incorruptível, destinada a acolher sob as
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19. A tão alta antiguidade remontam, segundo o Sr. C. PEREIRA, os transvios do cristianismo. "Data do quarto século a larga sementeira da cizânia que irá medrando exuberante pelos séculos em fora. Na disciplina, na doutrina e no culto operou-se a tríplice paganização do cristianismo em um lento e largo afastamento da simplicidade e pureza da Igreja primitiva", p. 6.
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suas tendas as gerações do porvir. Eis a significação real do protestantismo.20 Eis outrossim a sua condenação, a seta fatal que se lhe embebeu no peito e há de arrastá-lo à morte inevitável: Haeret Lateri lethalis arundo.

Se Cristo é Deus, se Cristo fundou uma Igreja, essa é indefectível e imortal como as obras divinas. Mas se a Igreja caiu no erro, as portas do inferno prevaleceram contra ela e Cristo não manteve a sua promessa. Cristo enganou-nos, Cristo não é Deus, e o cristianismo é uma grande impostura. É tão forte a consequência que muitos protestantes por este motivo abjuraram o cristianismo. "Se na religião partimos de um princípio sobrenatural (como uma revelação, a Bíblia, por exemplo ou o Corão), cumpre necessariamente admitir que a Divindade, comunicando uma revelação ao homem, deve prover outrossim o modo de impedir que o sentido desta revelação não seja abandonado às arbitrariedades do juízo subjetivo. Esta inconsequência de Jesus Cristo não me permite considerá-lo senão como um sábio benfeitor".21 OCHIN, outro protestante, que no dizer de CALVINO, era mais sábio ele só que a Itália inteira, chegava pelo mesmo caminho à mesma conclusão. "Considerando, de um lado, como poderia a Igreja haver sido fundada por J. C. e regada com o seu sangue, e, do outro, como poderia ela ser fundamentalmente adulterada pelo catolicismo, como estamos vendo, conclui que aquele que a estabeleceu não podia ser o Filho de Deus; faltou-lhe evidentemente a Providência".22 E OCHIN, renunciando ao protestantismo, fez-se judeu.

Nada, com efeito, como já vimos, mais deametralmente oposto aos ensinamentos e promessas do Evangelho do que a idéia de uma
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20. O pensamento é de DE MAISTRE: "Au moment marqué et de tout temps announcé, il [Dieu] ne dédaigna pas de sein d'une vierge; il se revêtit de nottre malheurese nature et parut sur la terre. Nous le vêmis, nous le touchâmes, il nous parla, el vécut, il enseigna,, il souffrit, el mourut pour nous. Sorti de son tombeau, suivant, sa promesse, il reparut encore parmi nous pour assurer solennellement à son Eglise une assistance aussi durable que le monde. Mais, hélas! cet effort de l'amour tout-puissant n'eut pas à geaucoup prèstout le succès qu'il annonçait. Par défaut de science ou de force, ou par distraction peut-êntre, Dieu manqua son coup e ne put tenir sa parole. Moins avisé qu'un chimiste qui entreprendrait d'enfermer l'éther dans la toile ou le papier, il ne confia qu'à des hommes cette vérité qu'il aviat apportée sur la terre, elle s'échappa donc comme on aurait bien pu le prévoir par tous les pores humains: bientôt cette religion sainte, révélée à l'homme par l'Homme-Dieu ne fut plus qu'une infâme idolâtrie qui durait encore, se le christianisme après seize siècles, n'eut été brusquement ramené à sa pureté originelle par deux misérables. Voilá le protestantisme". DE MAISTRE, Du Pape, I, 4, Conclusions, Ed. 1819, Lyon, pp. 656-7.

21. STAUDLIN, Magazin de l'histoire de la religion, 3c. partie, p. 83.

22. Citado na obra Dialogues sur le protestantisme, p. 55.
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Igreja que pode desgarrar da sua primeira isntituição, pregar o erro e a corrupção. O Espírito de Verdade havitará nela para todo o sempre: prometeu-o formalm,ente Cristo. Formalm,ente mandou-nos o
Senhor que obhedecêssemos à Igreja em todos os tempos e em todos os lugares. Não nos disse: Escutai a Itgreja durante 300 ou 1.000 anos, mas ouvi-a sempre, sem nenhum limite de tempo, sem nenhuma reservall, sem nenhuma restrição: "quem não ouve a Igreja seja condenado como pagão ou pecador", MATTH. XVII, 17. Ora, evidentemente, antes de LUTERO existiu uma Igreja, a Igreja Católica, que por uma sucessão ininterrupta de pastores ascendia aos apóstolos, e, por meio dos apóstolos, ao próprio Cristo. Esta era a Igreja instituida pelo Salvador, está a Igreja de que falama as promessas evangélicas. Fora dela, a história não conhece outra. Quando nasceram as igrejas luteranas, calvinistas e angelicanas, já a Igreja católica tinha uma existência quinze vezes secular. Desde Jesus Cristo só há uma Igreja, a grande Igreja, como a chamavam os pagãos, a Igreja, simplesmente, sem eptítetos derivados de nomes humanos, como a chamamos nós. Diante deste fato, afirmai agora, como diz C. PEREIRA, que essa Igreja entrou a corromper-se no 4.º século e de todo adulterou a doutrina evangélica nas "trevas caliginosasda Idade Média" e tereis anulado as promessas de sua Providência, atributo distintivo da Divindade. STAUDLIN e OCHIN são lógicos. Entre p catolicismo e o naturalismo deísta não há racionalmente meio termo. Se a Igreja católica foi em algum tempo a verdadeira Igreja, nunca cessou, nunca cessorá de o ser, até o fim dos tempos.33 Senão, Jesus Cristo enganou-nos. Seitas cristãs acatyólicas são superfetação parasitária destinada a uma existência efêmera.

Por uma feliz incoerência, porém, muitos protestantes não resvalaram até ao fundo do abismo. Parando à meioa encosta, esforçam-se por conservar alguns restos de cristianismo. Mas nem estes deixaram de sentir o fio cortante do argumento: onde estava a Igreja antes de LUTERO? com um aforçuramento digno de melhor causa entraram a reevolver os anais do passado em busca de ascendentes em que entroncar a sua árvore genealógtica. Sigamo-los por um momento neste baldado empenho.

Onde esta a Igreja antes de LUTERO? "Capciosa apergunta, acode o Sr. C. PEREIRA, estava onde outrora estava o povo de Deus,
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23. Bem dizia aquele filósofo: Se o Messias já veio, devemos ser católicos; de não veio, judeus; em nenhuma hipótese, protestantes.
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estava cativa em Babilônia. Gemia no ergástulos da Cúria", p. 131. A reforma não a revocou "dos sepulcros da história, mas dos cárceres de Roma", p. 131.

Que por tal esperava? O gramático paulista, inimigo jurado das metáforas, numa questão de importância transcendental, esquece a velha ogeriza e envovle nas obscuridade de um tropo enigmático a insuficiência de uma evasiva mesquinha. Pergunta-se-lhe pela existência da Igreja, de uma sociedade visível, organizada, depositária de uma corpo definido de doutrinas, e ele nos responde lcaconicamente: a Igreja estava em Babilônia, cativa nos ergástulos da Cúria! Como! Cristo funda um reino que, pela evidência dos seus caracteres sobrenaturais, devia atrair todas as almas ávidas de luz e de amor e a instituição divina eclipsa-se por séculos nos calabouços de Roma, onde, só a conseguiram lobrigar os olhos penetrantes de LUTERO, fadado a restituir-lhe a liberdade! Historicamente porderia dezer-nos o Sr. PEREIRA onde se achavam os calabouços de Roma e quais os heróis que durante onze séculos no fundo destes subterrâneos transmitiram de geração em geração o facho da fé?

Voltemos a página em busca de maior clareza. Nova metáfora e esta dramatizada em prolontgada alegoria. Inspiram-na sem dúvida ao autor as reminiscências do ofício: é um exercício de composição escolar. "Não criaram religião nova os Reformadores; tão pouco fundaram de novo a Igreja de Cristo. O herdeiro de um trono é lançado nas masmorras de infecta prisão por uma conjuração de falsos pretendentes. Um dia, porém, de lá o tiram seus amigos. Quie diferente o aspecto do infeliz príncipe! Esquálido, desgrenhado, maltrapilho, não tinha realmente parecença do que fora e do que era. Mas ei-lo transformado e retituído ao seu estado no garbo e magestade de um rei sobre o seu trono! Tal a Igreja. Onde estava ela antes da Reforma? Onde estava o rei antes da restuaração? Ao rei não lhe privou dos direitos a violência de seus inimigos; à Igreja não lhe arrancou a vida e tão pouco a dignidade a crudelíssima opressão de hierarquia papal", p. 132.

Como composição retórica de literato noviço não está de todo má. Copmo resposta à "pergunta capciosa" é de uma pobreza miserável. Entre o príncipe carcerado e o príncipe livre há simples diferenças superficiais; face esquálida e face rubicunda, cabelos desgrenhados e melenas penteadas, vestes esfarrapadas e mantos de púrpura. Sob estas acidentalidades, porém vive o mesmo com com suas idéias, afetos e sentimentos; quem o conheceu nos grilhões reconhece-lo-á n o trono. Mas entre a Igreja antes de LUTERO e a
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reforma luterana, que abismo de diferença! Onde o catolicismo dizia sim, o protestantismo disse não; onde o catolicismo negava, afirmou o protestantismo.24 Dogma,. moral, culto, disciplina, tudo abre, entre católicos e protestantes. Um fosso de insondável profundidade. Não há analisador de idéias capaz de ver no cristianismo anterior à reforma um protestantimo macilento, despenteado e farroupilha,. Mais: o príncipe alegórico do Sr. PEREIRA era um mortal como qualquer outro, sujeito às duras vicissitudes da fortuna humana. Um dia prevaleceram os seus adversários e aferrolharam-no nos latíbulos de uma enxovia. A Igreja traz na fronte a promessa divina de que indefectibilidade; não haverá Igreja irreconhecível por "esquálida, despenteada e maltrapilha", não haverá "pretendentes" que a sobrepujem porque está escrito que as forças do mal não prevalecerão contra ela.

E aí está, em estilo metafórico e sibilino, quanto nos diz, neste passo, o Sr. PEREIRA em resposta "à pergunta capciosa". Em outro lugar, sob a epígrafe "precursores e prenúncios da reforma", p. 17, tenta o apologista protestante tecer, em linguagem menos alegórica, o catálogo das "pias testemunhas da verdade", em cujos corações devotos buscou asilo o cristianismo oprimido pela autocracia de Roma. E ei-lo, todo açodamente, todo afã, a revolver os anais da heresia para colher, de longe em longe, os farrapos de erros de sectários esquecidos a fim de com eles serzir uma vestidura antiga destinada a cobrir a nudez do protestantismo recém-nascido.

No século IV VIGILÂNCIO, obscuro presbítero espanhol opõe-se ao culto dos santos e das relíquias? Eis um autêntico depositário da verdade. Que importa que S. JERÔNIMO e, com ele, a Igreja universal o condenasse como inovador e herege? VIGILÂNCIO prevalece.

No século IX, CLÁUDIO, bispo de Turim, no seu furor iconoclasta, quebra imagens? Eis um legítimo predecessor da Reforma.

E nos dez primeiros séculos do cristianismo, por mais que diligenciasse em escavações históricas, não logrou o protestantismo encontrar outros ascendentes. O fogo sagrado da fé, apagado em toda a Igreja, conservou-se aceso no peito fiel de VIGILÂNCIO e de CLÁUDIO!
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24. O próprio Sr. Pereira dá-nos a p. 404 uma lista de nada menos de 23 "erros principais inoculados no Cristianismo latino e refugados pelo Protestantismo, por sua inconguência original com o credo e práticas cristãs". O primeiro destes erros é "a falsa concepção da Igreja". Como se vê o catolicismo começa errando pela base: não sabe o que é a Igreja. Que muito ignore também "as condições exclusivas de Salvação", o número dos sacramentos, a regra de interpretar a Bíblia, a necessidade do sacrifício, et., etc.?
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Nos séculos seguintes ARNALDO da Bréscia, PEDRO de Bruys, WICLEF, JERÔNIMO de Praga, JOÃO HUSS, SAVANAROLA, os Valdenses e os Albigenses ressuscitam das cinzas do olvido, e as suas sombras proscritas recebem o diploma honorífico de avoengos da Reforma. Evocando assim a memória desses cúmplices do mesmo crime, conseguem apenas os protestantes recuar de duas ou três centenas de anos o berço impuro da sua heresia. Não nos assuste, porém a árvore genealógica. Aproximemo-nos curiosos desta "pias testemunhas" da verdade... sentinelas perdidas na noite sombria da idade média", p. 17.

CLÁUDIO, bispo de Turim, era ariano, isto é, negava a divindade do Verbo; era ademais, discípulo de NESTÓRIO, isto é, negava a unidade de pessoa no Cristo. - Pia Testemunha da verdade!

ARNALDO DE BRÉSCIA foi um frade irrequieto, turbulente, revolucionário à la LUTERO. Amotinou Roma contra o Papa, obrigando-o a fugir; invadiu e pilhou as casas dos cardeais. Constrangido pelo povo romano a deixar a cidade foi, por fim, preso e justiçado por Frederico Barbaroxa. Pia testemunha da verdade!

PEDRO DE BRUYS ensinou que era inválido o batismo das crianças, que os edifícios eclesiásticos eram inúteis. Consequente com estas doutrinas entrou a abater cruzes e derrocar igrejas. Numa sexta-feira santa, pôs-se a assar carnes sobre um monte de crucifixos em brasa; o povo indignado insurgiu-se e levou-o à fogueira. Pia testemunha da verdade!

WICLEF doutrinou que a propriedade do clero é contrária à Escritura; que as autoridades civis e eclesiásticas cessam de ser legítimas, quando cometem pecado grave; que os senhores temporais podiam, a seu bel prazer, apropriar-se dos bens dos prelados que não vivessem isentos de culpa; que os súditos podiam, a seu talante, punir os superiores; que S. AGOSTINHO, S. BENTO e S. BERNARDO, se se haviam condenados; que tudo é Deus e a liberdade uma quimera. JOÃO HUSS e JERÔNIMO de Praga propagaram as extravagâncias de WICLEF no Boêmia. - Pias testemunhas da verdade!

Os albigenses tiveram origem numa infame colônia de maniqueus que do Oriente passaram à Itália e da Itália à França. Admitiam dois princípios, um do bem, outro do mal, ensinavam metenpsicose, negavam a divindade e humanidade de Cristo, a imortalidade pessoal, a criação do mundo por Deus. Em moral, pregavam a mais horrível dissolução, ensinavam a propagação da
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espécie fora do matrimônio à maneira dos brutos, aprovavam o suicídio, preconizavam a dissimulação e a mentira, davam-se à prática dos mais abomináveis excessos de impudência. Fanatizados por estas doutrinas, os novos hereges atacaram violentamente, com as instituições eclesiásticas, toda a ordem social vigente. Saquearam mosteiros, abateram igrejas, espoliaram sacerdotes, expulsaram bispos de suas sedes, profanaram altares, violaram os vasos sagrados, conculcaram o corpo de Cristo, corromperam a justiça, talaram os campos semeando por toda a parte o horror, a desolação e a morte. Eram os socialistas e comunistas do tempo. Assaltaram o matrimônio, a família e a propriedade; se houvessem triunfado, a ruína universal, o retorno à barbaria e à depravação pagã teriam sido as consequências de sua vitória".25 - Pias testemunhas da verdade!

Bem se podem ufanar os protestantes de tão ilustre prosápia. Coroem muito embora estas frontes desonradas com a auréola de mártires. A sonoridade vazia de um glorioso título usurpado não vingará abafar a voz poderosa da história que os estigmatiza com ferrete da ignomínia.

Mas passemos, por um instante, a esponja na biografia destas "pias testemunhas da verdade"; não insistamos sobre os caminhos desta singular Providência que teria escolhido estes refugos dada santidade e da honra para vasos de eleição em que se conservasse, puro e incorrupto, o bálsamo divino do cristianismo.

Cerremos mais de perto a verdade. Foram realmente estes antigos inovadores, pais genuínos de todos os dogmas da reforma do século XVI? É perfeita a consonância dogmática entre os seus sentimentos e as negações de LUTERO? Não . Há erros comuns, não há identidade perfeita de doutrina. Há artigos pelos quais batem fé os heresiarcas de antiga e nova fama, não há um símbolo que os reúna a todos na comunhão de uma mesma crença.

VIGILÂNCIA e CLÁUDIO combateram o culto das imagens. Mas quando assaltaram o primado de Pedro? Quando preconizaram a Bíblia como regra exclusiva de fé? Quando ensinaram a doutrina da justificação e mil outros erros de LUTERO?

ANRNALDO de Bréscia levantou-se contra o Sumo Pontífice (daí as simpatias). Mas onde, no frade amotinador, os outros ensinamentos da Reforma?
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25. DOLLINGER, Kirche und Kerchen, München, 1861, p. 51.
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WICLEF insurgiu-se contra o Papa e chamou Roma de sinagoga de Satã. Basta aos protestantes estes poderoso vínculo de afinidade para perdoarem ao heresiarca inglês a invocação dos santos, o culto das imagens, a fé no Purgatório.26
JOÃO HUSS admite a transubstanciação, celebra missa até à morte, invoca os santos, venera-lhes as imagens, crê nos sete sacramentos e no purgatório. Mas, como WICLEF, levantou bandeira contra o Papa e declamou contra Roma, igreja do anticristo. É esse o único artigo fundamental do protestantismo, é a indulgência plenária que perdoa todos os pecados e cobre todos os erros.

Os Albigenses, se apresentam algumas afinidades com os luteranos, rejeitam-lhe a dooutrina fundamental da justificação pela fé.

SAVONAROLA, fogoso e violento Dominicano, flagelou com desusada eloquência os vícios de Florença. Não inpugnou nenhum dogma católico, mas a sua obstinada desobediência ao Papa é um título suficiente ao diploma de "pia testemunha da verdade".

Que prova, pois, esse esforço ingente dos reformadores em exumar ascendentes? Uma só verdade: e é que o protestantismo é o grande receptáculo que, na sua vasta capacidade de erro, acolheu quase todas as heresias do passado. Uma só consequência desprende-se destas baldadas diligências históricas, e é que as doutrinas abraçadas pelo Reforma estão em diametral oposição com a fé do cristianismo antigo que as repeliu sempre do seu seio como falsas e heterodoxas.

Que o protestantismo, porém, não é "uma inovação, mas uma renovação" é o que o Sr. C. PEREIRA não logrou nem sequer tornar provável. Não há nehuma seita que perfilhe todas as negações e todas as afirmações fundamentais do protestantismo. O estigma da novidade ninguém lho apagará da fronte. Quando o presbiteriano escreve que a Reforma é apenas "a designação nova de uma nova fase da Igreja" e que "não houve solução de continuidade na vida secular da Esposa de Cristo", p. 131, falsifica
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26. Sobre WICLEF, guindado pelo gramático brasileiro às alturas de precursor da Reforma, ouça-se o juízo de um dos fundadores do protestantimo: "Pode julgar-se WICLEF pelo erros que enxameiam na sua doutrina. Da justiça da fé não entendeu til; confunde o Evangelho com a política; sustenta que aos sacerdotes não é lícito possuir; fala do poder civil de modo sedicioso e falaz; com a mesma sofistaria cavila sobre a opinião universalmente recebida acerca da ceia do Senhor". MELANCHTHON, cit. por BOSSUET, Hist. des variations, I. IX, n. 161.

A WICLEF negam também o diploma de precursor da Reforma os modernos protestantes: LOOFS, Leifeden zum Studium der Dogmergeshichte, Haile 1906, pág. 645; A. HARNACE, Lehrbuch der Dogmengeschichte, III (4), Tübingen, 1910, p. 482.

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escandalosamente a história e abusa indignamente da boa fé e da credulidade dos seus leitores, se ele próprio não é a primeira vítima inconsciente da sua ilusão. Não houve solução de continuidade na vida da Igreja? Que nos mostre, então o temerário apologista uma comunidade, uma associação de fiéis, que, "sem solução de continuidade" dos tempos apostólicos ao século XVI, professasse, o credo proteiforme do protestantismo. Vou mais além. Que nos demonstre a continuidade histórica de um só dos artigos fundamentais desse símbolo heterodoxo: a guerra ao Papado, por exemplo, o livre exame, a justificação pela fé,27 a negação do sacrifício da Missa ou da presença real de Cristo na Eucaristia, ou mais adiante ainda. Desafio o Senhor CARLOS PEREIRA diante do público brasileiro a assinalar um só homem, um só que, antes de LUTERO, houvesse ensinado todas as suas doutrinas. Enquanto não nos vier esta demonstração categórica que deve ser fiadora das suas asserções gratuitas, continuaremos a perguntar-lhe como TERTULIANO aos hereges do seu tempo: qui estis? Quando et unde venistis? (quem sois? Donde viestes?) Por que nascestes tão tarde? Em que recônditos latíbulos vos escondestes que ninguém vos conheceu antes do século XVI? Onde estava a Igreja de Cristo antes de LUTERO?
Pergunta capciosa? Não; pergunta molesta, pergunta irrespondível, pergunta que vale por si uma apologia inteira, pergunta inexoravelmente fatal ao protestantismo.
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27. Do seu dogma da justificação, que ele considera como a "summa christianismi". Weimar, XXV, 328, escreve o próprio LUTERO: "Nenhuma religião há, em toda a terra que ensine esta doutrina da justificação: Eu mesmo, ainda que a ensine publicamente, com grande dificuldade a creio em particular". Weimar, XXV, 330. Em argumento análogo CALVINO "Pouco se me dá do que acerca da satisfação se lê correntemente nos antigos autores. Confesso que alguns dentre eles, ou para falar com sinceridade, todos... neste ponto erraram ou se exprimiram com demasiado rigor". Inst., I, III, c. 4, n. 38, Opere, II, 489.

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Mesma pág.no Bloco seguinte.

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